quarta-feira, 5 de junho de 2013

Os desafios continuam: caminhada até Dingboche


Deboche
Saindo de Deboche
O trekking em altitude sempre representa um bom desafio e cada dia cobra sua cota de esforço dos caminhantes. Frio, oxigênio cada vez mais rarefeito, subidas e descidas. Ficamos pensando que tudo isso é parte de um projeto maior, que há um objetivo ao final, mas também não podemos viver apenas pensando no futuro ou corremos o risco de não apreciar as belezas que aparecem a cada curva da trilha. Esta dualidade já foi descrita por Robert Pirsig, autor do livro Zen e a Arte da Manutenção de Motocicletas:

Montanhas devem ser escaladas com o menor esforço possível e sem desejo. A realidade de sua própria natureza, deve determinar a velocidade. Se você tornar-se inquieto, acelere. Se você ficar sem fôlego, vá devagar. Você deve subir a montanha em um equilíbrio entre a inquietação e a exaustão. Então, quando você não está mais pensando no futuro, cada passo não é apenas um meio para um fim, mas um acontecimento único em si mesmo. Esta folha tem bordas recortadas. Esta rocha parece solta. Deste lugar a neve é menos visível, embora mais próxima. Estas são as coisas que você deve observar. Viver apenas para um objetivo futuro é superficial. São os lados da montanha que sustentam a vida, e não o topo. Aqui é onde as coisas crescem. Mas, claro, sem a parte superior você não pode ter nenhum lado. É o topo que define os lados


Vidro com gelo
Vidro da janela do quarto
Deixando a filosofia um pouco de lado, despertar e sair do saco de dormir quentinho para receber o chá oferecido pelos sherpas não é tarefa fácil. Os quartos dos lodges não têm um grande isolamento térmico e tampouco aquecimento. Infelizmente, não levamos um termômetro para fazer os registros, mas o vidro com gelo acumulado na janela já dá uma idéia da temperatura durante a noite.

O planejamento para o 6º dia de caminhada, onde saímos de 3800 para 4300m, era visitar o mosteiro de Pangboche, para receber as bençãos do Lama. Entretanto, uma das expedições com montanhistas que iriam escalar o Everest já havia se programado para passar lá e, como a cerimônia iria durar pelo menos umas 2 horas, ficou decidido que faríamos a visita na volta, sem parar naquele vilarejo.

Grande parte do caminho até Dingboche é feita margeando despenhadeiros e logo quando saímos, o vento frio nos obrigou a usar os anoraks. A latitude da região do Everest, entretanto, é 28º N, ou seja, pouco além do Trópico de Câncer. Assim, bastava o sol aparecer para amenizar o frio. Também começamos a perceber que a vegetação vai se tornando mais escassa. Arbustos vão substituindo as vistosas coníferas das altitudes inferiores.

Frio Anoraks
Pose para foto no frio

Caminhada
Subida
Pinturas com motivos religiosos
Pinturas com motivos religiosos

No caminho para Dingboche 2
Vale com os terraços de agricultura delimitados pelos
muros de pedra. No horizonte, o Ama Dablam
Alguns membros do grupo tiveram diarréia, mas nada grave e os efeitos da altitude causaram dor de cabeça em vários outros. O monitoramento diário com oxímetro, realizado pelo Manoel Morgado, foi ótimo para descartar algum diagnóstico mais preocupante. Afinal, a 4300m temos aproximadamente 60% do oxigênio disponível ao nível do mar e esse percentual só diminui com a altitude. Daí, é normal a redução na saturação de oxigênio no sangue e o aumento na freqüência cardíaca.

No caminho para Dingboche

Como chegamos mais cedo ao lodge, descansamos um pouco e ficamos conversando na área mais aconchegante de qualquer hospedagem: o restaurante - com seu aquecedor movido a esterco de yak. Para variar o cardápio, finalmente compartilhamos o queijo provolone e o salame que Vitor e Maia conseguiram trazer do Brasil e sobre os quais faziam propaganda há dias. Ótimos!

Vilarejo de Dingboche
Vilarejo de Dingboche. Ficar aqui é uma boa alternativa à Periche (cerca de 200m abaixo),
pois é mais ensolarado e menos sujeito aos ventos gelados.

À noite, assistimos o vídeo “Tocando o vazio” (Touching the Void), um documentário que conta a história real e quase trágica da ascensão de uma montanha de 6000 m nos Andes Peruanos. A incrível persistência de um dos protagonistas é, certamente inspiradora, embora ninguém queira passar nem um pouquinho do que ele viveu.

E para fechar, tivemos uma pequena festa no restaurante. Os sherpas cantaram músicas nepalesas ao som do tambor e gaita. Apesar do cansaço, até arriscamos uns passos de forró. Não estranhe. Pode ter sido os efeitos da altitude Smiley piscando

Outros posts da Série

1 - Como é !? Vão subir o Everest?
2 - Chegada à Kathmandu
3 - Explorando Kathmandu
4 - Kathmandu–Pashupatinah e Boudhanath
5 - Voando para um dos aeroportos mais extremos do mundo (Lukla)
6 - Começamos a jornada! Caminhada até Monjo
7 - Namche Bazaar
8 - No caminho para Thamo, a visita a monges budistas
9 - Rumo ao Everest Base Camp: chegamos aos 4000 metros
10 - Como as cargas são transportadas no Himalaia
11 - A caminhada continua. Rumo à Deboche
12 - Sol e esterco: fontes energéticas no Himalaia
13 - Os desafios continuam: caminhada até Dingboche
14 - Uma curta caminhada, lindas paisagens e um desafio
15 – Entrevista com Manoel Morgado
16 – Lobuche e o Memorial aos Sherpas mortos
17 – Quase Lá: Gorak Shep
18 – Kala Patthar: 5500m e a melhor visão do Everest
19 –  Acampamento Base do Everest:Objetivo conquistado
20 – Retorno do Acampamento Base do Everest – de Gorak Shep a Deboche
21 – Terminando a caminhada: de volta a Lukla

4 comentários:

  1. Ei Jodrian,
    Lindas fotos!
    Não consigo nem imaginar o frio que passaram. Só de ver a foto da janela eu já fico congelando!
    Abraços,
    Lillian.

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    Respostas
    1. Obrigado, Lillian
      Era um frio danado, mas os sacos de dormir e os agasalhos funcionaram bem :)
      Abraço

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  2. Bela descrição e narração, expedição fantástica!

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